quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

140 caracteres - MAM SP


A  ideia é muito atraente, fazer uma leitura das manifestações que ocorreram  em junho de 2013 no Brasil através de 140 obras do acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo. O título remete a uma rede social, o twitter, que limita em 140 toques a mensagem que pode ser postada, ou seja, o terror dos prolixos, o twitter exige a síntese como exercício cotidiano.

Tudo foi produzido como fruto de um Laboratório de Curadoria,  que aconteceu no MAM,  que expressou o desejo de organizar uma exposição com obras do acervo do museu que incitassem a reflexão sobre a mobilização política por meio de redes sociais.

A maioria das obras selecionadas são dos anos 70, anos de chumbo no Brasil, onde a arte em vários momentos expressou-se contra a ditadura militar brasileira. Como as manifestações de junho são um fato extremamente recente, que ainda está sendo digerido, estudado e decodificado,  não existe no acervo do MAM obras que tenham sido produzidas impactadas por esse acontecimento.

O que poderia ser uma contradição acaba abrindo possibilidade de leituras novas para obras "antigas".

Declaración de los Derechos Humanos - León Ferrari - 2007



Uma mamadeira de plástico com uma xilogravura da Declaração dos Direitos Humanos, uma obra que discute a época da ditadura argentina. Uma imagem clara a Declaração como um alimento básico para crescermos e sermos cidadãos do mundo. Um mundo democrático.

Ironia do destino: em 2004, Leon Ferrari em uma exposição em Buenos Aires foi duramente atacado pelo cardeal Jorge Bergoglio, que dizia que a obra do artista " era uma blasfemia que envergonhava a cidade". O Centro Cultural Recoleta foi invadido por católicos conservadores que aos gritos de "Cristo Rei" destruíram várias obras de León Ferrari. O motivo da ira era a obra "A Civilização Ocidental e Cristã".


Justo no ano passado, o Cardeal Bergoglio foi eleito Papa e comanda a Jornada da Juventude no Rio de Janeiro, durante o período pós manifestações, e León Ferrari morreu aos 93 anos, em 25/7/2013, em Buenos Aires.

Tempo suspenso de um estado provisório - Marcelo Cidade - 2011


Uma placa de vidro com uma base de concreto e madeira, essa obra de Marcelo Cidade,  discute o medo e a violência urbana, o vidro estilhaçado pela bala. Os conflitos e os traumas de viver numa sociedade com as características de intensa desigualdade social.

A partir das manifestações essa imagem ganhou outros significados, como não olhar para um vidro estilhaçado e não pensar nos Black Bloc. Esse novo ator social , que usa como tática de manifestação política a destruição de vitrines de bancos e lojas de grandes corporações.

O MAM SP com 140 Caracteres conseguiu abrir de forma instigante a sua temporada de exposições de 2014.

140 Caracteres
Museu de Arte Moderna de São Paulo
Parque do Ibirapuera
De 28/01 a 16/03/2014

sábado, 11 de janeiro de 2014

O padeiro que fingiu ser Rei de Portugal


Parece uma tradicional piada sobre português ou então um título de uma ficção de realismo fantástico, mas na verdade, trata-se de um interessante resgate histórico efetuado pela pesquisadora Ruth Mackay, vinculada a Universidade de Stanford, na Califórnia -  EUA.

O livro dedica-se a estudar o período do século XVI, quando em 1578 o rei de Portugal, Dom Sebastião, desaparece numa batalha em Marrocos, a Batalha de Alcácer Quibir, onde as tropas portuguesas sofrem uma grande derrota para os mouros.

Como o jovem Dom Sebastião, que tinha 24 anos e governava Portugal a uma década,  não tinha herdeiros o trono de Portugal foi ocupado pelo Rei da Espanha, Felipe II, ocasionando a junção do Império Ibérico sobre o comando espanhol.


O corpo do Rei nunca foi devolvido à Portugal, isso junto com a submissão à Espanha, criou-se um mito, o sebastianismo. Basicamente a ideia é que o Rei não estava morto e voltaria para salvar os portugueses da submissão espanhola. Mito que persiste até hoje a fé que um Sebastião retornará para libertar Portugal dos seus problemas.

A trama que o livro narra é a tentativa de frei Miguel , um agostiniano vinculado a nobres portugueses que reivindicavam o trono português em transformar um padeiro como D. Sebastião, construindo um história que o Rei envergonhado com a derrota em Alcácer Quibir fez um juramento de ficar 20 anos longe de Portugal e passou a viver como um plebeu.

O enredo logo chegou aos ouvidos de Felipe II, que desmontou a trama dos religiosos com setores da nobreza ibérica, óbvio que os depoimentos foram regados a muita tortura e resultaram em prisões e mortes.

O sebastianismo enredou-se pelo sertão brasileiro, Antônio Conselheiro abusava do mito do sebastianismo, como um messias que voltaria para trazer de volta a Monarquia. Até o treinador de futebol Felipão, na sua passagem pelo futebol português ( onde conseguiu um vice campeonato europeu e o quarto lugar na Copa do Mundo ) foi considerado um "Sebastião" que voltava para trazer alegrias aos portugueses.

O padeiro que fingiu ser Rei de Portugal
Ruth Mackay
Editora Rocco