sábado, 22 de fevereiro de 2014

Cristiano Mascaro - Turista Hotel - Cena das Artes no Centro de SP I


Em ano de Bienal de São Paulo a agenda de exposições na cidade fica mais carregada e com ótimas possibilidades de descobrir o mundo das artes. Neste início de 2014 dei conta de uma oferta muito interessante de exposições  na região central da cidade, primeiro pensei usar meu horário de almoço para ir conferindo, mas com o calor infernal do verão paulistano mudei a estratégia. Construí um programa de visitas aos diversos equipamentos culturais da região para acompanhar a cena da arte no centro de SP.


Primeira parada foi na Casa da Imagem - Museu da Cidade de São Paulo - que fica instalada no Solar da Marquesa de Santos, patrimônio histórico da cidade, edificação do século XVIII, que fica na região da Praça da Sé.


Na Casa da Imagem está ocorrendo a exposição " Turista Hotel" do fotógrafo Cristiano Mascaro. A carreira de Cristiano é marcada pelo olhar urbano, ele documenta a cidade com uma sensibilidade e poesia própria. O cenário paulistano é o foco principal de sua obra. A exposição é centrada pela imersão no universo do bairro do Brás na década de 70.


O Brás do anos 70 de Cristiano, difere do Brás do início do século XX de Antônio Alcântara Machado, as crônicas de "Brás, Bexiga e Barra Funda" mostra a industrialização de São Paulo e o bairro como espaço das fábricas e moradias operárias dos imigrantes italianos. Universo similar ao relatado por Dráusio Varela no livro "Nas ruas do Brás" que mostra ainda esse cenário nos anos 50 do século passado.


As imagens dos anos 70 de Cristiano Mascaro mostra um "outro" Brás. O bairro do comércio popular, com uma grande presença de nordestinos. Cenário urbano de grande fluxo de pessoas pela estação de trem e de corredor de ônibus para os bairros distantes da zona leste.


O cinema de rua era muito presente nessa região, o corredor Rangel Pestana  / Celso Garcia concentrava grande número de salas de cinemas que atualmente transformaram-se em templos de igrejas evangélicas.

O homem placa é um outro personagem desse universo urbano, utilizando o próprio corpo como suporte publicitário, divulga o comércio local nos pontos de concentração do bairro.

O Brás do século XXI já apresenta uma outra configuração, agora com uma presença marcante da comunidade boliviana que ocupa esse bairro carregado de história.

Turista Hotel
Exposição individual de Cristiano Mascaro
18 de janeiro a 6 de abril de 2014

Rua Roberto Simonsen, 136B

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A cadeira de Barbeiro de Miguel Sousa Tavares


Estava hoje cortando meu cabelo, sentado vendo os cachos despencarem da minha cabeça , cachos cada vez mais com o predomínio do branco, quando veio uma imagem do último livro que li do Miguel Sousa Tavares, Madrugada Suja.

Miguel Sousa Tavares é um jornalista português que virou um best seller com o livro "Equador", tendo como característica uma literatura leve, envolvente e sempre com muitos elementos da história de Portugal. Podemos até dizer que a trilogia Equador, Rio das Flores e Madrugada Suja conta a história de Portugal do século XX, com o advento da República, o início da ditadura Salazar ,  a Revolução dos Cravos e a entrada de Portugal na Comunidade Européia.


Madrugada Suja foi lançado no Brasil, pela Companhia das Letras, no final de 2013, tem como cenário o Alentejo e o contexto histórico dos últimos 40 anos, da Revolução dos Cravos até os dias atuais. Miguel usa um pouco das imagens típicas do realismo fantástico latino americano, uma minúscula aldeia alentejana, Medronhais da Serra, que vai sendo abandonada por seus habitantes....até ficar apenas um, Tomaz da Burra, o avô do personagem central da trama.

Em uma pequena aldeia alentejana a divisão do espaço público entre os  gêneros fica evidente. No domingo de manhã enquanto as mulheres ficam dentro da Igreja, ouvindo as palavras do padre; os homens ficam na barbearia, ela é o centro da discussão da política, da vida social da aldeia. A barbearia muito mais que cuidar da aparência dos homens, ocupa o papel central na discussão da política da época, a barbearia é o parlamento de Medronhais da Serra.

O mais hilário é que com o definhamento da aldeia, com a morte dos idosos e com a migração dos jovens para Lisboa ou para outros países da comunidade européia, a Barbearia Central é fechada e Tomaz da Burra arremata no desmanche da barbearia a poltrona.

A poltrona , símbolo provinciano da democracia,  tribuna nas discussões acaloradas que lá ocorriam e concorria com o púlpito católico. A imagem da poltrona do barbeiro como centro da vida pública de uma pequena aldeia do Alentejo foi a que veio aos meus devaneios enquanto meus cachos caiam...